Era estranhamente reconfortante sentir o comboio colocar-se em andamento, era uma sensação de mobilidade que me agradava enquanto o sol se esforçava por espreitar entre as nuvens.
Ia fazer uma “corrida” de 40 minutos até ao meu desejado e tão merecido café.
As pessoas entravam no material ansiosas de descanso depois de uma noite de folia e exageros, um grupo de “adolescentes” entre os 12 e 40 anos praguejavam na minha direcção, numa tentativa de adivinhar o meu nome, nunca acertando. “Que burros”; pensei eu, “até trago o nome escrito ao peito”, ironizando comigo mesmo.
Mais um pouco e chego à Damaia, sítio “chique”, com as suas majestosas moradias e os seus jardins de perder de vista, como se fosse um casamento entre a Quinta da Marinha e Vilamoura. Abri a porta e deparei-me com um indivíduo que me mirava, completamente hipnotizado, os olhos raiados de sangue e um sorriso irremediavelmente idiota. Acendeu um “cigarrito” e soprou alguma fumaça enquanto puxava conversa:
–“Tá-se bem ó pica?”, falando lentamente.
-Tudo na maior, respondi eu de forma autoritária.
-Queres uma passa?
-Não amigo, comi doze passas antes da meia-noite, por agora chega. O seu vocabulário era riquíssimo, talvez só superado por um papagaio amestrado e com gripe das aves, pensei eu.
Fez-se um silêncio perturbador, tentou colocar os seus neurónios a funcionar,
-“Iá, tá-se bem”, conheces o Geigei?, perguntou apontando para o seu “lulu”. O animal tinha os maxilares cerrados e os olhos apertados. Confesso que senti o coração a bater mais depressa, afinal o “lulu” era um Pit Bull e não parecia nada simpático.
Fechei a porta com alívio e segui viagem, nesse momento um pensamento macabro atravessou-me o pensamento, imaginava o Gegei a brincar com o dono, roendo-lhe as pernas até ao osso.
Tinha as emoções divididas entre o cómico e o decadente, ainda assim tive pena do cão, não pode escolher o dono.
Mais adiante, o meu imaginário é interrompido, desta vez por uma velhinha de cabelo grisalho:
-Posso lhe dizer um segredo?
-Claro, respondi eu com alguma relutância.
-A única solução é mandar os Americanos clonarem o Salazar, disse franzindo a testa.
Foi demais, não aguentei e soltei uma gargalhada estridente, desejando um bom ano à sábia velhinha e seguindo o meu caminho.
Depois de vencidos alguns obstáculos, com algumas gargalhadas à mistura eis que chego a Sintra, a minha terra prometida o meu oásis, finalmente estava em porto seguro, pensei “vou beber o meu café”, mais uma frustração, “porra, hoje é Domingo, está tudo fechado…”
Até à próxima amigos.